sábado, 17 de janeiro de 2009

A criação da mulher feminina

O livro que leio atualmente é tão bom e básico, que sinto uma enorme e irresistível vontade de postar trechos aqui. Trata de um tema q amo, gênero e papéis sexuais. Adoraria saber o que vcs acham. BJs

Fonte: NAVARRO, R.
A Cama na Varanda.

A roupinha azul para o menino e a rosa para a menina inauguram as diferenças marcantes que a partir de então a sociedade vai delinear. Os bebês meninas são mais carregados no colo que os bebês meninos. Os pais são mais vigorosos e violentos ao brincar com os meninos. Isso tem um resultado imediato: as meninas são menos agressivas que os meninos. Espera-se que seja assim. As meninas ganham bonecas, panelinhas e casinhas, enquanto os meninos recebem presentes como carrinhos, armas, bolas de futebol. Se um menino gosta de brincar com as meninas de casinha, fazendo comida para as bonecas, raros são os pais que não se afligem. Imediatamente, sugerem que ele vá brincar com coisas de menino (depois ninguém entende por que os homens não ajudam no trabalho doméstico). Espera-se que as meninas sejam gentis, meigas, delicadas, fechem as pernas ao sentar e não falem palavrão. Caso contrário, são logo repreendidas com severidade: "Isso não são modos de uma menina."
Juan Carlos Kusnetzoff, no livro A mulher sexualmente feliz, relata uma pesquisa realizada em Montevidéu, demonstrando que a mulher, desde a idade escolar, não pode dispor do mesmo espaço físico que o homem. Há uma limitação de seus movimentos e, além disso, ela não tem o poder de dispor sobre o seu tempo livre. O comportamento de meninas e meninos do ensino básico foi observado no próprio ambiente de estudo e recreação. Os meninos acusavam as meninas de egoístas, de não emprestar seu material escolar. As meninas concordavam com isso, alegando que os meninos são grosseiros, agressivos, e que se apropriam do material delas. Isso ocorre desde os primeiros dias de aula do primeiro ano, o que deixa claro os valores e as expectativas que as meninas trazem de casa.
"O material é extensão do corpo da menina e mesmo nessa tenra idade ela sabe que não deve emprestar (o material e o corpo) aos colegas do sexo oposto. 'Eles querem apenas isso.' 'Querem só usá-las.'" As meninas perdem o material escolar com muito menos freqüência que os meninos e, para eles, os pais o repõem com mais rapidez.
"Como se pode ver, numerosos e significativos padrões já estão sendo assimilados e fixados nessa idade: o sentido de posse e de cuidado; a responsabilidade pela perda; a diferenciação no que se refere aos mesmos valores em relação ao sexo oposto; a possibilidade de movimento e conquista de espaço."

As professoras costumam sentar os meninos junto das meninas, alegando que a menina, mais atenta, mais disciplinada e boazinha, acalma o menino, sempre inquieto e impulsivo. "Ou seja, desde pequena, a mulher cuida do homem, limitando os movimentos dele e limitando-se."
Em alguns países, é no uso do uniforme tipo avental que essa ideologia se evidencia mais dramaticamente. Os meninos usam uniforme abotoado na frente, enquanto o das meninas é pregueado, com um laço e botões atrás. Isso faz com que as meninas precisem de ajuda para vestir, abotoar, desabotoar e despir o avental. "Pode ser que esse costume não vigore em muitas regiões ou grupos sociais, hoje em dia, mas serve para exemplificar como se transmite a ideologia. (...) O avental das meninas é o princípio em que se acertam e se aperfeiçoam a opressão e dependência."
As meninas devem sempre recorrer a alguém que as ajude. Mas a situação se torna realmente trágica e ridícula na hora do recreio, quando costumam ir ao banheiro. As meninas invejam a rapidez e comodidade dos meninos, que dispõem de mais tempo de recreio e diversão, esperando até o último momento para ir ao banheiro, enquanto elas se vêem atrapalhadas e freadas por aquela roupa. "Esses conceitos de tempo e espaço, assimilados em criança, vão evoluir no psiquismo com conseqüências na sexualidade adulta."

3 comentários:

Stefanie disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luisa disse...

parece ser interessante o livro mesmo.
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ideologias passadas e repassadas.

bjo

giggia Barreto disse...

Antropologia pura. Muito bom. Muito bom mesmo!!!